sábado, janeiro 30, 2010

Deus me Livro!


Estava para postar um bem-humorado texto no blog, nominado “o Vampiro das Arcadas”, quando recebo uma notícia que foi um verdadeiro banho de sangue frio, digo, água fria no meu animus jocandi: o digníssimo senhor ex-diretor da Faculdade do Largo de São Francisco e atual reitor de outras paragens, depositou os livros da Biblioteca ao relento, no meio da chuva, no Pátio das Arcadas. Como se fossem entulho. Lixo mesmo.

Há quem não creia em premonição. Just like me. Nem em bruxas. Deixemos de lado então a outra estorieta sobre vampiros. Vamos a esta, tão mais real e premente.

Monteiro Lobato, um franciscano, escrevia: uma Nação se faz com Homens e Livros. Este outro franciscano aqui, complementa: em não havendo mais os primeiros, para que os segundos?

Atos humanos são recheados de símbolos. Ao interpretá-los, geralmente conseguimos atingir o âmago da verdade dos fatos, suas causas e origens. Fatos são fatos, não usam símbolos. Estes são mera criação humana.

Por isso, fica fácil depreender razões do porque livros são tratados como entulho, verdadeiro lixo, imprestáveis. Estamos no País que elegeu um analfabeto para Presidente. Analfabeto por pura opção. Que não é o caso da mãe dele e de milhões de outros brasileiros: segundo sua própria declaração, sua mãe já nasceu-lhe analfabeta. Isso porém ocorreu e ocorre como a um câncer social. Não é uma opção ao indivíduo, mas um carma. Grilhões de dificílimo desvencilhamento. Eu que o diga.

Já para o dito cidadão, Imperador do Mato Virgem, seu analfabetismo, sua inguinoranssia lhe serviu de plataforma política, estandarte real do seu povo. Ai, que preguiça! Tão real que foi eleito por uma maioria incontestável. Tão real que sua aprovação atinge níveis históricos não só nacionais, mas mundiais. Realmente, um digno e ignorante representante do seu ignorante povo. A inguinoranssa abarca milhões de dipromados também.

As Arcadas, cantada e decantada ilha de excelência intelectual e humana, fez a sua magnífica História não pela beleza do seu prédio, realmente belo, nem por decurso de prazo, pelos seus CLXXXIII anos de existência. Sim, porque, nesse nosso Brasil acima descrito, algumas coisas se tornam boas por antiguidade, realmente por decurso de prazo. Ai está o Jorge Benjor para comprovar o que digo. A excelência das Arcadas se fez por seus alunos. Que são pessoas do povo, por óbvio.

Mesmo essa blindagem de excelência mostrou-se insuficiente para impedir que até as Arcadas fossem atingidas por nefasta amostragem de nossa população inteira que elegeu e aprovou a criação do País Lula. E parece que eles almejam adentrar por esse Pátio com o fito único de desmerecê-lo, de rebaixá-lo, de vulgarizá-lo, de neutralizá-lo. De destruí-lo, enfim. Qualquer coisa que se pareça com excelência em qualquer coisa se torna nociva, no País da incompetência plena e instituída e do povo que privilegiou a ignorância, colocando-a num pedestal a ser ostentado, são coisas que precisam ser anuladas, destruídas. Nesse Brasil, tão carente de excelências, parece que as Arcadas se transformaram então em alvo único. Confesso que tentei em vão relacionar as outras excelências que temos. Não saí do número um. Da Número Um. Infelizmente única. O orgulho de ser parte Dela misturou-se à frustração de não poder continuar a lista. Não, eu não inclui na lista que somos campeões em futebol, que nossas praias são lindas, que as brasileiras têm as bundas mais lindas do planeta e nem que somos o País do futuro. A abordagem era outra.

Por isso, livros serem agora lançados ao relento é algo absolutamente coerente. Para que servem ?

Nos meus primeiros anos escolares, o que mais se ouvia, de professores, pais, adultos, a título de estímulo e motivação enfim, era que crianças precisávamos estudar e ter conhecimento. Com eles poderíamos até chegar a ser Presidentes da República, se quiséssemos! Por isso o Livro era símbolo, sempre os símbolos, do conhecimento e do acesso à oportunidade. E que essas eram a verdadeira riqueza: o conhecimento e o acesso à oportunidade. O resto são apenas vaidades...

Essa, a razão da indignação. Presenciamos uma realidade vil e desprezível. Por certo que hoje, a mais brilhante das franciscanas não obterá o êxito e o sucesso que a Geizy, da Uniboa obteve. Esse é o País Lula, o que não precisa, o que despreza livros. Que pretende mudar a letra do Hino Nacional, porque é “muito difícil”, ao invés de letrar a todos, incluindo os candidatos à Presidência, para que as palavras não lhes pareçam monstros. Existe comunicação além do “eae, cumpanhero?”. Que pretende implantar nas Arcadas cotas de insuficientes intelectuais, ao invés de preparar-lhes melhor o intelecto para que estejam aptos à Ela e a todas as outras coisas que quiser se capacitar a atingir. Não via fraude, mas por meritocracia.

Nesse indefectível País que cultua a ignorância, Tradição nada vale, pois que tradição é cultura acumulada e transmitida. A Ignorância é intransmissível. Tenho ainda que ouvir que, dos livros lançados ao relento, metade são imprestáveis, pois que ultrapassados e antigos. Isso dito por alunos das Arcadas, acredite se quiser e puder. Certamente são mesmo a escória, amostragem franciscana do brasileiro que entronou o Imperador Lula, o Mínimo. Filósofos gregos afirmavam peremptoriamente que o átomo é indivisível. Nem por isso seus escritos foram jogados ao lixo, nos escombros de Hiroshima e Nagasaki. A evolução do conhecimento é aditiva, não alternativa. Árabes, ditos bárbaros e fanáticos ignorantes, destruíam tudo que fosse cristão. Exceto suas Bibliotecas e Universidades. Hitler, erigido à anti-cristo, destruiu Paris. Mas o Louvre permaneceu intacto.
No Império do Mato Virgem, os livros das Arcadas são jogados ao lixo. Deus, onde estás, que não respondes? é alusão pertinente, desesperadas palavras de um outro ilustre franciscano

O valor dos livros da Biblioteca da Faculdade do Largo de São Francisco vai além da pequenez de serem fonte para alunos fazerem as próximas provas ou fundamentarem suas Teses de Láurea. Eles são prova da excelência das Arcadas, fundamentam a sua Tradição e testemunham a sua gloriosa História. Não são importantes porque a Faculdade é tombada. Tombamento não se aplica às Arcadas.

Tombamento é uma inútil tentativa humana de congelar no tempo feitos e glórias passadas, por falta de feitos presentes. Gregos ainda cultuam seus faraós e pirâmides; portugueses ainda aguardam Dom Sebastião, deleitando-se com os recentes versos de Camões e as peças de Gil Vicente; ingleses ainda se bronzeiam sob o Sol que nunca se põe em seu vasto espectro de império. São saudosistas de glórias passadas e faz-lhes bem tentar congelar o tempo. Mesmo sabendo que inutilmente.

Mas a magnífica História das Arcadas não é algo tombado, congelado no tempo e que nos torna saudosos dela. Sua História é algo presente. Não só a cultuamos, mas a vivemos, compomos diariamente mais uma página dela. A despeito da infiltração nela de cidadãos desse execrável País, que se utilizam do conceito de excelência das Arcadas para galgar degraus e atingir poder suficiente para destruí-la, por ser símbolo de um Poder maior.

Fica explícito então que escrevo aos que não lançam livros ao lixo. Muito menos aqueles da Biblioteca da Faculdade. Muito menos as Arcadas. Por isso estou certo que falo a poucos, posto que a população do País Lula mostra-se imensa. Para que não permitam a insanidade e protejam nossos livros. Das intempéries e da ignorância. Pois, conforme uma famosa poesia, já permitimos que estranhos se apossassem do Pátio; hoje eles lançam nosso livros ao lixo. Amanhã você será convidado para o re-re-re-lançamento da pedra fundamental da Faculdade de Direito no campus do Butantã. E ai então a Faculdade do Largo de São Francisco estará realmente tombada, transformada em Museu, com suas glórias apenas passadas e ambos apenas seremos, você e eu, saudosos de um tempo que já não existe mais.

Luiz Gonzaga
Arcadas, XXX de janeiro, CLXXXIII

4 comentários:

Renan disse...

Belíssimo texto.

gfbaz@hotmail.com disse...

O conceito da Gloriosa, no Brasil e no mundo, foi edificado pelo conhecimento, pelo senso crítico, pelas lutas, pelas liberdades.

Parte da nossa verdadeira escola, consubstanciada nesses livros, transformar-se-á em escombros.

Ainda não consegui acreditar que os livros serão despejados como entulhos.

Se os livros realmente sofrerem qualquer tipo de danificação, denunciaremos ao Ministério Público.

Sds.

Monja Copista disse...

Doutor, nunca pensei que fosse chegar a dizer isso, mas o SENHOR desincumbiu-se da tarefa de relatar a realidade barasileira com veradeira maestria.
É inenarrável a angústia de atrever-se a ser educadora neste país e deparar-se com questões como "estudar pra quê, se posso ser político e ficar rico?". Ou verificar o programa da sétima série de uma escola estadual e ver escrito "radiciação", sabendo que os alunos não sabem ainda nem como multiplicar. Aliás, não têm nem idéia de que a multiplicação na verdade seja uma forma rápida de somar. E vão assim somando anos de iguinorância, seperdiçando tempo precioso de "cabeça boa".
É incríível como preferem mascarar tudo com cotas ou aprovação obrigatória, tapando o sol com a peneira e selando um verdadeiro pacto com a mediocirdade.

Um dos homens mais sábios do mundo, Salomão, dizia: "Assim, cheguei a esta conclusão: Deus fez os homens justos, mas eles foram em busca de muitas intrigas" (Eclesiastes 7:29)

Excelente desabafo.

Renato Leon disse...

Realmente, a situação é péssima. Ainda mais o Rodas, que tem um currículo extenso, um homem pretensamente culto, jogar livros fora. O pior é o silêncio dos alunos, que deveriam ter em si o espírito de contestação. Depois de tantas glórias, essa é uma grande vergonha. E esse diretor agora é reitor, e ele vai receber a biblioteca do Midlin...