quinta-feira, abril 12, 2012

A descriminalização do abortamento

A mortalidade materna por tentativa de abortamento ou consequente a ele é uma questão de saúde pública, endemia no Brasil. Nesse momento, em algum lugar desse nosso imenso e ignorante País há uma gestante morrendo em decorrência de um abortamento feito sem as mínimas condições de higiene e conhecimentos específicos. 

Antes de defender uma ideia, há que se defender o vernáculo, a pobre e sofrida língua portuguesa. Abortamento é o ato de abortar. Aborto é o concepto. O que o ordenamento jurídico brasileiro criminaliza de maneira vetusta é então o Abortamento. Só por esse motivo já podemos inferir a ignorância que açambarca os fazedores de leis: legislam sem conhecer as realidades fáticas, com uma linguagem que também desconhecem. 

Defender a Descriminalização do Abortamento não traduz uma visão moral, religiosa, de direitos segmentários ou quaisquer outros movimentos em voga. Trata-se de Saúde Pública. Trata-se de defender a Vida e a Dignidade Humana de milhares de mulheres que, já vítimas de uma gravidez indesejada, tornam-se também vítimas de um sistema punitivo canhestro e burro. 

Aos puristas do Direito e escravos de um legalismo cego, há que se lembrar da Antinomia: uma norma que leva a morte é decorrente de uma constituição que veda a pena de morte.A criminalização do Abortamento leva pessoas a procurarem soluções que as conduzem à morte. Num simples silogismo aristotélico então, a criminalização representa a pena de morte.

Aos moralistas que hipocritamente defendem a Vida, a Dignidade, que ficam buscando querer cronometrar bioquimicamente o início da Vida para então criar o fantasma do homícidio de uma vida em potencial, é antes preciso defender a Vida e a Dignidade de uma vida já plena, castigada pelo infortúnio, socialmente execrada e criminalizada pelo Direito: a gestante de uma gravidez indesejada que busca o Abortamento como solução. Num simples raciocínio: dos males o menor. 

O raciocínio do recurso "dos males o menor" é desconhecido daquelez que vivem em seus gabinetes atapetados criando leis para "situações em hipótese" e também dos magnânimos senhores doutores doutrinadores de um Direito absolutamente distante da realidade dos fatos. Desconhecido também por aquele que senta em trono de ouro, gerenciando a exploração do sofrimento humano pelo mundo afora. Pessoas comuns do povo vivem tal e qual em um campo minado, desviando-se de um "certo-ou-errado" criado sem realmente conhecer os fatos da vida real. Não vivem, mas sobrevivem. Nesse contexto, o Abortamento entra como solução. Não a melhor, pois não a tem, mas a possível.

A criminalização do Abortamento é mesmo verdadeira Pena de Morte, num País que hipocritamente se auto-idolatra por condená-la. Além das milhares vidas que ceifa, ainda cria as situações tão vexatórias quanto absurdas de bebês serem encontrados em lixões, ou abandonados à própria sorte em qualquer lugar, vítimas de um Abortamento mal-sucedido. Serão, em futuro próximos, vítimas de um sistema que os marginalizará.

Pelos meandros do poder há os que impedem e são contra a descriminalização por um outro crime surdo, muito maior: seus interesses pecuniários em manter o Abortamento como ato ilegal. Pessoas qualificadas para realizarem os mesmos Abortamentos, só que em ambiente cirúrgico asséptico, em clínicas suntuosas, a custos astronomicamente distantes daqueles que conhecemos dessa vidinha aqui, do SUS. O Ilegal é mais caro, argumenta-se. Para essas distintas e privilegiadas gestantes, a Lei se cala. Assim como todo o aparato repressivo estatal, diante da anestesiante presença de uma porcentagem pré-estabelecida. Porcentagem essa que é rateada e percorre os mais variados caminhos, até desaguar no custeio da eleição daqueles que manterão a Criminalização, como um supremo valor moral a ser defendido em palanques. Um ciclo vicioso, além de asqueroso.   

Há ainda que se lembrar que descriminalizar não significa obrigar. Significa que àquelas que optarem pela manutenção assim o poderão fazer. Porém, não torna criminosa aquela que não deseja a manutenção, pelas razões de foro íntimo que à ninguem deve satisfação. O absurdo "direito gestacional" é e deve ser considerado como um direito subjetivo da gestante, com a faculdade de conduzir a gestação da maneira que melhor lhe convier. Inclusive interrompê-la. Para tanto, não importa inclusive a razão que levou à decisão: violência sexual, quaisquer anomalias (genéticas, mal-formações como a polêmica Anencefalia,  ou quaisquer outras) ou pura e simplesmente o exercício do seu inerente direito de interromper a gestação.      
 
Por essas razões, há que ocorrer a Descriminalização do Abortamento, apenas fundamentada em algo digno, real e palpável, a Saúde Pública. A real e concreta vida da mãe, que deseja a interrupção com segurança e sem ter se tornado por isso alvo de um sistema jurídico anacrônico. Porque, as demais razões que o criminalizam, tais como morais, religiosas ou mesmo a pura hipocrisia são mais criminosas que o crime que criaram.



Um comentário:

Worship Heart Forever disse...

Acho que deviam tambem descriminalizar o homicidio, quando a vitima for politiqueiro franciscano
Afinal, trata-se de uma questao de saude publica, ou "a gente de bem" mata esse tipo de erva daninha, ou um monte de calouro burro acaba contaminado...

Francamente, doutor. Raciocino falacioso por raciocinio falacioso, o meu ainda e melhor, porque nao sacrifica inocentes.